sábado, 23 de abril de 2011

JAN HUSS

JAN HUSS

Jan Huss, encarnação anterior de Allan Kardec, viveu num século de contradições religiosas. Ele nasceu por volta de 1370, filho de uma pequena família camponesa que vivia na aldeia de Hussinek, na Boêmia, e ingressou na Universidade de Praga quando tinha dezessete anos. A partir de então, toda sua existência transcorreu na capital do país, excetuados os dois anos de exílio e encarceramento em Constança.

Jan Huss foi influenciado pelas idéias de Wycliff (1333-1384), teólogo e reformador inglês que desenvolveu alguns tratados sobre o dominium, ou seja, a idéia de que o poder vem de Deus e apenas é legítimo naqueles que se encontram em estado de graça. As suas teses contrariavam os interesses da Igreja Católica; expressava-se ele contra o poderio papal, os votos religiosos, os benefícios e riquezas do clero, as indulgências e a concepção tradicional acerca do sacerdócio, e por adotar essas idéias Jan Huss sofreu inúmeras admoestações por parte do clero. Completou o seu curso na Universidade onde se formou como bacharel em Teologia em 1394, e em Artes em 1396. Trabalhou na fixação da ortografia e na reforma da língua literária tcheca. Jan Huss, como professor da Universidade de Praga, distinguiu-se nas discussões, no conhecimento de Aristóteles, na Bíblia e nos Santos Padres. Ele procurou nos escritos de Matias Janov e Chtitny as soluções deles para as inquietudes que propagava a Bíblia, como única fonte de verdade e fé. Essa influência afastou Huss da doutrina católica e sua heterodoxia, com a leitura da obra de Wycliff, particularmente “Diálogos e Triálogos”, trazida de Oxford, por Jerônimo de Praga.

Em 1400 foi ordenado sacerdote, e no ano seguinte passou a ocupar o cargo de Reitor da Universidade, passando a considerar-se teologicamente sintonizado com o ponto de vista de John Wycliff. No ano seguinte (1401), tornou-se pregador na capela de Belém, em Praga capital da Boêmia e tinha o apoio do Arcebispo. Ali pregou com dedicação a Reforma pela qual muitos tchecos, propugnavam desde os tempos de Carlos IV. Sua eloqüência era tamanha que aquela capela em pouco tempo se transformou no centro do movimento reformador. Venceslau e sua esposa Sofia o escolheram para seu confessor e lhe deram seu apoio. Alguns dos membros mais destacados da hierarquia Católica começaram a encará-lo com receio, mas boa parte do povo e da nobreza parecia segui-lo, e o apoio dos reis ainda era suficientemente importante para que os prelados não se atrevessem a tomar medidas contra o pregador entusiasmado.

No mesmo ano em que passou a ocupar o púlpito de Belém, Huss foi feito reitor da Universidade, de modo que se encontrava em ótima posição para impulsionar a Reforma. Ao mesmo tempo em que pregava os abusos da Igreja, ele continuava sustentando certas doutrinas geralmente aceitas e nem mesmos seus piores inimigos atreviam-se a lhe censurar a sua existência ou suas idéias. Huss ensinava que o perdão dos pecados só se poderia obter por contrição e penitência sincera, e nunca comprada por dinheiro, conforme fazia a Igreja. Mais tarde, ele desmascarava a velhacaria dos que atraiam numerosos peregrinos a Wilsnack, com falsos milagres, e
com o apoio do Arcebispo, publicou um tratado onde desenvolvia a tese de que qualquer cristão não devia correr atrás de milagres.

Em 1411, Huss é excomungado de sua congregação, e todos os cultos, cerimônias de batizado e funeral feitos por ele, foram anuladas. Tal ato trouxe grande revolta aos cidadãos de Praga, os quais defenderam Huss. Um conflito surgiu então nos círculos universitários: Um discípulo de Huss, Jerônimo de Praga, passou algum tempo na Inglaterra, e trouxe consigo algumas das obras mais radicais da reforma inglesa. Sem demora, os ataques contra Huss, Jerônimo e seus seguidores ampliaram-se. Religiosos começaram a ver nos ensinos de Wycliff uma ameaça séria à Igreja A opinião de Huss e seus companheiros já eram conhecidas de todos, a ponto de terem surgido passeatas do povo, em protesto contra a maneira de Igreja explorar o povo tcheco. O resultado disso foi um grande tumulto popular em Praga, quando Huss com o apoio do rei Ladislau, proibiu a venda de indulgências e foi festejado como herói nacional. Ele sustentava que o perdão dos pecados só poderia ser por penitência e nunca por dinheiro, e que nem o Papa nem qualquer sacerdote podiam levantar a espada em nome da Igreja; que a infabilidade do Papa era uma blasfêmia. Houve ainda o discurso inflamado de Jerônimo de Praga e surgiram cortejos satíricos onde era ridicularizada a Igreja Oficial.

Em vista dessa situação o rei de Nápoles estabeleceu a pena de morte para quem ofendesse o Papa, e logo três moços foram decapitados e foram enterrados solenemente, e Huss lhes fez o necrológio. Huss então foi tido como o líder de uma grande heresia e até chegou-se a dizer que todos os boêmios eram hereges. O cúmulo da corrupção papal aconteceu em 1412, quando João XXII lançou uma cruzada contra o rei Ladislau e ofereceu a remissão completa dos pecados, a todos os que participassem da guerra, ou a indulgência para os que a suportassem. Ao tomar conhecimento da notícia contrária a todos os preceitos bíblicos, Huss se volta contra o papado por usar sanções espirituais e indulgências para fins pessoais e políticos. Em contra-ataque, Huss é excomungado em Roma, por não ter comparecido perante a corte papal, sendo fixado um prazo para ele se apresentar. Se não o fizesse, a cidade de Praga ou outro qualquer lugar que lhe desse acolhida, estaria sob interdição. Dessa forma, a suposta heresia de Huss resultaria em prejuízo para essa cidade, fato esse que o obrigou a deixar Praga.

Entrementes, o imperador Sigismundo prometeu a Huss um salvo-conduto, se consentisse em comparecer ao Concílio de Constança, em 1414, o que Huss atendeu. Diante da promessa, se pôs á caminho e em Constança recebeu o dito salvo-conduto, onde dizia que ele poderia transitar morar e residir livremente. Mas, com o pretexto de que ele queria retirar-se da cidade, prenderam-no e internaram-no no Convento dos Dominicanos, em infecto recinto. Instauraram um processo e o ato da acusação coube a Etienne Palec. Começara a via-crúcis de Huss e no dia 5 de junho de 1415, Huss compareceu diante do Concílio. Foi ele tratado com se tivesse tentado fugir e acusado formalmente de herege e de seguir a doutrina de Wycliff, cujas teorias haviam sido condenadas anteriormente pelo Concílio.

Huss tentou expor suas opiniões, mas não pode e o seu julgamento foi adiado para o dia 7 do mês seguinte. Não havia maneira de resolver o assunto, pois o Conselho pedia que Huss se submetesse a ele, retratando-se das suas doutrinas, mas não queria escutá-lo e nem ele pode defender-se, porque vozes exasperadas interromperam-no e abafaram a sua palavra. Huss, porém, manteve a doutrina de que apenas o Cristo e não Pedro era o chefe da Igreja, e resistiu às promessas e ameaças que lhe fizeram e logo percebeu a situação que lhe aguardava. O cardeal Zabarella preparou um documento que exigia de Huss a retratação e ele respondeu com o apelo de Jesus: “Em suas mãos eu ponho a minha causa, pois Ele há de julgar cada um, não com base em testemunhos falsos e Concílios errados, mas na verdadeira justiça”.

Encarceram-no por muitos dias para que ele fraquejasse, mas ele continuou firme nas suas convicções. Ficou sob a guarda do Bispo de Constança, e depois lhe transferiram para o torreão do Castelo de Gottlieben, onde ficou aprisionado com correntes assim permanecendo por muitos dias e noites, sendo levado depois para o Convento dos Franciscanos. Em 6 de julho de 1415, foi proclamada sua condenação, sendo levado em seguida para a Catedral de Constança, e ali, depois de um sermão sobre a teimosia dos hereges, foi vestido de sacerdote e recebeu o cálice, tão somente para em seguida arrebatarem-lhe ambos, como sinal simbólico de que estava perdendo suas ordens sacerdotais. Depois disso, cortaram-lhe os cabelos fazendo-lhe uma cruz na cabeça, e em seguida colocaram-lhe um chapéu de papel, onde se lia a inscrição: “Hic est hoere siarcha” (Eis o herege).

Jan Huss então foi conduzido a um terreno vazio, despiram-no, amarraram-no a um poste, ajuntaram lenha em torno do poste e atearam fogo. Antes de ser queimado ele teria proferido a seguinte frase: “Hoje, vós assais um pato, mas dia virá em que o cisne de luz voará tão alto, que as vossas labaredas não mais alcançarão”. Em seguida ouviram-no então cantar – “Cristo, Fili Dei vivi, miserere nobis”. – Quando ele ia cantar a segunda linha, foi envolvido pelas chamas e pela fumaça e a voz morreu-lhe na garganta. Suas cinzas foram lançadas no rio Reno. E assim desencarnou queimado, aos 46 anos de idade, quem pregou contra a injustiça, a venalidade e a insinceridade, tendo enfrentado a fogueira com muita coragem.

Um ano após o martírio de Jan Huss, um discípulo seu também foi imolado na fogueira da Inquisição: Jerônimo de Praga, em 1416.

Séculos depois, esse Espírito reencarnaria na França como Hippólyte Leon Denizard Rivail, que ao conhecer o Espiritismo e fazer a Codificação da “Doutrina dos Espíritos”, adotou o pseudônimo de ALLAN KARDEC.

Bibliografia:
Marinei Ferreira Rezende
Jornal “O Imortal”- março/2009

Jc.
S.Luis, l5/04/2011

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