terça-feira, 3 de maio de 2011

MARIA DE MAGDALA ( Madalena)

MARIA DE MAGDALA (Maria Madalena)

Seis dias antes da Páscoa, foi Jesus para Betânia, para a casa de Lázaro. Marta servia, sendo Lázaro um dos que estavam à mesa. Então, entrou Maria de Magdala, e tomando uma libra de bálsamo de nardo puro, muito precioso, ungiu os pés de Jesus e os enxugou com seus cabelos; e a casa encheu-se toda com o perfume do bálsamo. Mas Iscariotes, um dos seus apóstolos, disse: “Por que não se vendeu este perfume por trezentos denários e não se deu aos pobres?” – Jesus então lhe disse: “Deixe-a; por que a molestais? Ela praticou uma boa ação para comigo. Porque os pobres sempre os têm convosco e, quando quiserdes, podeis fazer-lhes o bem, mas a mim nem sempre me tendes. Ela fez o que pôde: antecipou-se a ungir-me para a sepultura. Em verdade vos digo: onde for pregado o Evangelho, será também contado o que ela fez, para memória sua”.

Tempos depois, Jesus seguiu para Jerusalém, onde foi preso, julgado, condenado, e foi levado para um lugar chamado Gólgota, onde o crucificaram. E estavam ali muitas mulheres; eram as que vinham seguindo a Jesus desde a Galiléia, para o servirem; e entre elas estavam Maria mãe de Jesus, Maria de Magdala, Maria mãe de Tiago, a mulher de Zebedeu, e outras.

Após o sepultamento de Jesus e passado o sábado, Maria foi ao sepulcro e viu que a pedra que tapava a entrada do túmulo fora removida. Maria continuava junto ao túmulo e, enquanto chorava, olhou para o interior do túmulo e viu dois anjos. Então eles lhe perguntaram: “Mulher, por que choras?” – Ela lhes respondeu: “Porque levaram o meu Senhor, e não sei onde o puseram”. E tendo dito isto, voltou-se e viu Jesus em pé, mas não o reconheceu. – Perguntou-lhe Jesus: “Mulher, por que choras?” Ela supondo ser o jardineiro respondeu: “Senhor, se tu tiraste, dize-me onde o puseste, e eu o levarei”. Disse-lhe então Jesus: “Maria!” – Ela reconhecendo-o lhe disse em hebráico: “Rabôni” ( que quer dizer Mestre). Recomendou-lhe Jesus: “Não me detenhas; porque ainda não subi para meu Pai, mas vai ter com os meus irmãos, para dizer-lhes que eu ressuscitei e que se dirijam à Galiléia, e lá eles todos me verão”.

Ela foi á escolhida para anunciar a Imortalidade do seu Mestre, em razão da sua conversão, da sua dedicação e do seu grande amor ao Mestre, que modificou a sua existência de pecadora.

= x =

Maria de Magdala ouvira as pregações do Evangelho do Reino, não longe da Vila principesca onde vivia entregue aos prazeres, em companhia de patrícios romanos, e tornara-se de admiração profunda pelo Mestre.

Que novo amor era aquele, apregoado aos pescadores singelos por lábios tão
divinos? Até ali, caminhara ela sobre as rosas rubras do desejo, embriagando-se
com o vinho de condenáveis prazeres. No entanto, seu coração estava sequioso e

em desalento. Jovem e formosa emancipara-se dos preconceitos de sua raça; sua beleza lhe escravizara aos caprichos de mulher, os mais ardentes admiradores; mas seu espírito tinha fome de amor. O profeta nazareno havia plantado em sua alma novos pensamentos. Depois que lhe ouvira a palavra, observou que as facilidades da existência lhe traziam agora um tédio mortal ao espírito sensível. As músicas voluptuosas já não encontravam eco em seu íntimo; os enfeites romanos de sua habitação se tornaram sem graça e tristes. Maria chorou longamente, embora não compreendesse ainda o que queria o profeta desconhecido. Entretanto, suas palavras pareciam ressoar-lhe nas fibras mais sensíveis de mulher. Jesus chamava as pessoas para uma vida nova.

Decorrida uma noite de grandes meditações, e antes do banquete em casa de Lázaro, onde ela ungiria publicamente os pés de Jesus, nasceu o dia e ela embarcou numa barca que conduziu a pecadora até Cafarnaum. Dispusera-se a procurar o Mestre, após muitas hesitações. Como a receberia o Senhor, na residência de Simão Pedro? Seus conterrâneos não lhe haviam perdoado a vida de prazeres e o abandono do lar paterno. Para eles, ela era a mulher perdida que teria de encontrar a lapidação na praça pública. Sua consciência, porém, lhe pedia que fosse falar com Jesus, que tratava a multidão com especial carinho. Que lhe valiam as jóias, as flores raras, os banquetes luxuosos, se, ao fim de tudo isso, conservava a sua sede de amor!... Envolvida por esses pensamentos profundos, Maria de Magdala penetrou o umbral da humilde residência de Simão Pedro, onde Jesus parecia esperá-la, tal a bondade com que a recebeu num grande sorriso. A recém-chegada sentou-se com indefinível emoção a estrangular-lhe o peito e muito respeito.

Feita as primeiras saudações e vencendo as suas indecisões, Maria se pronunciou: “Senhor, ouvi a vossa palavra consoladora e venho ao vosso encontro!... Tendes a clarividência do céu e podeis adivinhar como tenho vivido! Sou uma filha do pecado; todos me condenam. Entretanto Mestre observe como tenho sede do verdadeiro amor!... Minha existência como todos os prazeres, tem sido estéril e amargurada...” As lágrimas lhe borbulhavam dos olhos, enquanto Jesus a contemplava, com bondade infinita. Ela então continuou: “Ouvi o vosso amoroso convite ao Evangelho! Desejava ser das vossas ovelhas; mas será que Deus me aceitaria?” – O profeta nazareno fitou-a, enternecido, sondando as profundezas do seu pensamento, e respondeu bondoso: “Maria, levanta os olhos para o céu e regozija-te, porque escutaste a Boa Nova do Reino e Deus te abençoa as alegrias! Acaso poderias pensar que alguém no mundo estivesse condenado ao pecado eterno? Onde então, o amor de Nosso Pai? Nunca vistes a primavera dar flores sobre uma casa em ruínas? As ruínas são as criaturas humanas; porém as flores são as esperanças em Deus. Sentes hoje esse novo Sol a iluminar-te o destino! Caminha agora, sob a sua luz, porque o amor cobre a multidão dos pecados”.

A pecadora de Magdala escutava o Mestre bebendo-lhe as palavras, porque nenhum homem havia falado assim à sua alma. Enlevada por essas palavras confortadoras e ouvindo as referências de Jesus ao amor, Maria comentou suavemente: “No entanto Senhor tenho amado e tenho sede de amor!...” Jesus lhe redargüiu: “Sim, tua sede é real. O mundo viciou todas as fontes de redenção e é preciso que compreendas que em suas sendas a virtude tem que marchar por uma porta estreita. A virtude no mundo foi transformada na porta larga da conveniência. O amor sincero não exige satisfações passageiras, que se extinguem no mundo com a primeira ilusão; trabalha sempre, sem amargura e ambição, com o júbilo do sacrifício. Só o amor que renuncia sabe caminhar para a vida suprema!...” Maria o escutava, embevecida e o interrogou atenciosamente: “Só o amor pelo sacrifício poderá saciar a sede do coração?” Jesus teve um gesto afirmativo e continuou: “Somente o sacrifício contem o divino mistério da vida. Na tua condição de mulher, já pensaste no que seria o mundo sem as mães extremadas no silêncio e no sacrifício?” Ouvindo isso, Maria começou a chorar e a sentir no íntimo o deserto da mulher sem filhos. Por fim, exclamou: “Desgraçada de mim, Senhor, que não posso ser mãe!...” Então o Mestre brandamente acrescentou: “E, qual das mães será maior aos olhos de Deus? A que se devotou somente aos seus filhos de carne, ou as que se consagraram por amor aos filhos das outras mães?”

Aquela interrogação pareceu despertá-la para meditações profundas. Maria sentiu-se amparada por uma energia interior diferente, que até então desconhecera. Jesus lhe honrava o espírito, convidando-a a ser mãe de seus irmãos em humanidade. Experimentando grande felicidade em seu íntimo, contemplou o Mestre com os olhos cheios de lágrimas e, no êxtase de sua alegria, murmurou comovida: “Senhor, doravante renunciarei a todos os prazeres transitórios do mundo, para adquirir o amor celestial que me ensinastes!... Acolherei como filhas as minhas irmãs no sofrimento e procurarei os infortunados para aliviar-lhes as feridas do coração.” Nesse instante, Simão Pedro passou pelo aposento e lançou um olhar de desprezo, e ela, já receosa de um dia perder a convivência do Mestre, perguntou: “Senhor, quando partirdes deste mundo, como ficaremos?” Jesus percebendo o motivo e o alcance da sua palavra, esclareceu: “Certamente que partirei, mas estaremos eternamente reunidos em espírito. Quanto ao futuro, é necessário que cada um tome sua cruz, em busca da redenção. Vai, Maria!... Sacrifica-te e ama sempre. Longo é o caminho, difícil á jornada, estreita a porta; mas a fé remove os obstáculos... Nada temas: é preciso crer e trabalhar!”

Mais tarde, depois da sua gloriosa visão do Mestre ressuscitado, Maria Madalena voltou de Jerusalém para a Galiléia, seguindo os passos dos companheiros queridos. Após algum tempo, os apóstolos começaram a abandonar a região, a serviço da Boa Nova. Ao partir os dois últimos companheiros para Jerusalém, Maria temendo a solidão, rogou a eles que lhe permitissem acompanhá-los e lhe foi negado o seu desejo. Temiam eles, o pretérito da pecadora e não confiam nela. Maria compreendeu, mas lembrou-se de Mestre e resignou-se. Humilde e sozinha resistiu as todas as propostas condenáveis e, sem recursos para viver, trabalhou pela própria sobrevivência, em Magdala e Dalmanuta. De vez em quando ia às
sinagogas, desejosa de relembrar as lições de Jesus. Por vezes, chorava de saudade, quando passeava no silêncio da praia, sob as árvores recordando a presença do Mestre.

Certo dia, um grupo de leprosos veio a Dalmanuta, cansados e tristes, em abandono, perguntando por Jesus, e todas as pessoas lhe deram as costas. Maria foi ter com eles e, sentindo-se com amplo direito de empregar sua liberdade, reuniu-os sob as árvores da praia e lhes transmitiu as palavras de Jesus, enchendo-lhes os corações com as claridades do Evangelho. Maria sentiu tamanha alegria no semblante dos infortunados, em face das suas palavras, e, por motivo das autoridades locais, terem ordenado a expulsão dos enfermos, Maria resolveu seguir para Jerusalém e eles seguiram em sua companhia. Chegados à cidade, foram conduzidos ao vale dos leprosos, onde Madalena penetrou com espontaneidade de coração. Seu espírito recordava as lições do Mestre e uma coragem se apossou de sua alma. Dali em diante, todas as tardes a mensageira do Evangelho reunia os seus novos amigos e lhe passava os ensinos de Jesus. Os doentes arrastavam-se até junto dela e lhe beijavam a túnica singela, e ela, lembrando o amor do Mestre, tomava-os em seus braços fraternos e carinhosos. Em breve tempo, sua pele apresentava, igualmente, manchas violáceas. Ela compreendeu a sua nova situação e recordou que o Mestre lhe dissera que somente sabiam viver os que sabiam imolar-se. Os seus moribundos esperavam a morte com um sorriso ditoso nos lábios. Nesse trabalho, muito tempo passou.

Passado alguns anos, sentindo-se no termo de sua tarefa meritória, Maria Madalena desejou rever antigas afeições de seu círculo pessoal, que se encontravam em Éfeso. Lá estavam João e Maria, mãe de Jesus, além de outros companheiros cristãos. Compreendendo que suas últimas dores terrestres estavam próximas; então decidiu pôr em prática seu sincero desejo. Nas despedidas, seus doentes vinham suplicar-lhe os derradeiros conselhos e recomendações, e ela envolvendo-os no seu carinho, lhes dizia: “Jesus deseja que nos amemos intensamente uns aos outros e que participemos das divinas esperanças, na mais extrema lealdade a Deus!...” Então os doentes lhe trouxeram o fruto das esmolas e as crianças vinham beijar-lhe as mãos. Em seguida a ex-pecadora abandonou o vale, e para chegar até o seu destino, percorreu muito tempo, e para isso, recorreu à caridade pública, sofrendo penosas humilhações e submetendo-se a sacrifícios. Observando as feridas pustulentas que substituíram sua antiga beleza, alegrava-se em reconhecer que seu espírito não tinha motivo para lamentações; Jesus a esperava e ela era fiel.

Maria achou-se um dia, às portas da cidade; mas um abatimento lhe dominava os centros de força física, no justo momento, quando as casas de Éfeso se lhe aparecia á vista, seu corpo alquebrado negou-se a caminhar. Foi quando uma modesta família de cristãos do subúrbio recolheu-a caridosamente a uma tenda humilde. Madalena pôde ainda rever amizades bem caras, consoante seus desejos, e por muitos dias de sofrimentos, debateu-se entre a vida e a morte. Uma noite, atingiram o auge as suas dores, porém sua alma estava iluminada por brandas reminiscências e, não obstante seus olhos se acharem selados, com os olhos da imaginação via o lago querido, os companheiros de fé, o Mestre bem-amado. De minuto em minuto, ouvia-se-lhe um gemido, enquanto os irmãos de crença lhe rodeavam o leito, com preces sinceras de seus corações amigos e desvelados.

Em dado momento, observou-se que seu peito não mais arfava. Maria, no entanto, experimentava consoladora sensação de paz. Sentia-se sob as árvores da Galiléia e esperava o Mestre. As aves cantavam nos ramos próximos e as ondas sussurrantes vinham beijar-lhe os pés. Foi quando ela viu Jesus aproximar-se, mais belo que nunca. Seu olhar tinha o reflexo do céu e o semblante trazia um júbilo indefinível. O Mestre estendeu-lhe as mãos e ela se prosternou, respeitosamente exclamando, como antigamente: “Meu Senhor!...” E Jesus recolhendo-a brandamente nos braços, lhe disse suavemente: “Maria, já passaste a porta estreita!... Amaste muito! Vem comigo... “



Bibliografia:
Evangelhos de João, Marcos e Mateus
Livro “Boa Nova” (Humberto de Campos, espírito)


Jc.
S.Luis, 25/4/2011

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