sábado, 21 de maio de 2011

YVONNE DO AMARAL PEREIRA

YVONNE DO AMARAL PEREIRA

Véspera de Natal de 1900, seis horas da manhã, na pequena Vila de Santa Tereza de Valença, hoje Rio das Flores, no estado do Rio de Janeiro, renasce em lar espírita, Yvonne do Amaral Pereira, primogênita do casal Manoel José Pereira Filho e de Elisabeth do Amaral Pereira. Ela teve cinco irmãos, além de outro irmão mais velho, filho do primeiro casamento de sua mãe.

Seu pai, pequeno comerciante, homem generoso de coração e desprendido dos bens materiais, faliu por três vezes por favorecer a clientela em prejuízo próprio. Tornou-se pouco depois, funcionário público, de cujos poucos proventos sustentou a família, até sua desencarnação em 1935. Yvonne viveu em lar pobre e modesto, aprendendo com os pais a servir os mais necessitados, pois em sua casa sempre eram recebidos com carinho, pobres criaturas sem recursos, inclusive mendigos.

Contam seus biógrafos que, com 29 dias de nascida, depois de um acesso de tosse, sobreveio uma sufocação que a deixou como morta, em estado de catalepsia. Durante 6 horas permaneceu nesse estado; o farmacêutico e o médico atestaram a morte por sufocação, e o velório foi preparado. A suposta defunta foi vestida de branco e azul e encomendado o caixão. A sua mãe, que não acreditava que a filha estivesse morta, retirou-se para outro aposento, onde orou fervorosamente a Maria de Nazaré, pedindo por sua filha. Instantes depois, a criança acordou aos prantos.

Sua infância foi povoada de fenômenos espíritas, muitos deles narrados no livro “Recordações da Mediunidade”. Aos 4 anos de idade já se comunicava com os Espíritos, que considerava pessoas normais, encarnadas. Duas entidades lhe eram particularmente caras; o primeiro, o Espírito de Charles, que fora seu pai carnal em outra existência e a quem considerava como tal, devido a lembranças vivas de sua encarnação anterior. Foi seu orientador durante toda sua existência, inclusive nas atividades mediúnicas. O segundo, o Espírito de Roberto de Canalejas, que fora médico espanhol em meados do século XIX, pelo qual nutria um profundo afeto e com o qual tinha ligações espirituais de outros tempos. Mais tarde, como adulta, manteria contatos mediúnicos regulares com outras entidades evoluídas, como o Dr. Bezerra de Menezes, Camilo Castelo Branco e Fredéric Chopin.

Aos oito anos de idade, repetiu-se o fenômeno da catalepsia, associado á um desprendimento parcial. Aconteceu à noite e a visão que teve marcou-a pelo resto da existência. Em Espírito, foi parar ante uma imagem do “Senhor dos Passos”, na igreja que freqüentava. Pedia socorro, pois sofria muito, e a imagem, então adquirindo vida, dirigiu-lhe as seguintes palavras: “Vem comigo, minha filha, será o único recurso que terás para suportar os sofrimentos que te esperam”. Aceitou a mão que lhe era estendida, subiu os degraus e não se lembra de mais nada.

De fato, Yvonne Pereira foi uma criança infeliz. Vivia acossada por uma imensa saudade do ambiente familiar que tivera na sua última encarnação na Espanha e que lembrava com extraordinária clareza. Por esse motivo, considerava sua família
atual, principalmente seu pai e irmãos, como estranhos. Para ela, o pai verdadeiro era o Espírito de Charles e a casa, a da Espanha. Esses sentimentos desencontrados e o afloramento das suas faculdades mediúnicas faziam com que ela tivesse comportamento considerado anormal por seus familiares. Por esse motivo, até os dez anos, passou a maior parte do tempo vivendo na casa da avó paterna.

Em ambientação reencarnatória propícia, teve aos 8 anos o primeiro contato com um livro espírita. Aos 12 anos, o pai deu-lhe de presente “O Evangelho Segundo o Espiritismo”e “O Livro dos Espíritos”, que a acompanharam pelo resto da existência, sendo a sua leitura repetida, sempre como um bálsamo nas horas difíceis. Aos 13 anos começou a freqüentar as sessões espíritas, que muito a encantavam, pois via os espíritos comunicantes. Ela teve como instrução escolar apenas o curso primário. Não pôde, por motivos econômicos, fazer outros cursos, o que representou uma grande provação para ela, pois amava o estudo e a boa leitura, tanto que, aos 16 anos, já tinha lido obras de grandes autores como Goethe, Bernardo Guimarães, José de Alencar, Alexandre Herculano e Arthur Conan Doyle. Desde cedo teve de trabalhar para o seu próprio sustento.

O fenômeno da catalepsia se tornou comum na sua existência a partir dos 16 anos de idade. A maior parte das reportagens de além-túmulo, dos romances, das crônicas e contos relatados por Yvonne Pereira, foram transmitidos do mundo espiritual através desse processo. A sua mediunidade, porém, foi muito diversificada. Foi médium psicógrafa e receitista, assistida por entidades de grande elevação, como o Dr. Bezerra de Menezes, Charles, Roberto de Canalejas e Bittencourt Sampaio. Possuía mediunidade de efeitos físicos, chegando a realizar algumas sessões de materialização, mas nunca sentiu atração por essa modalidade mediúnica. Os trabalhos que mais gostava de fazer, no campo da mediunidade, eram os de desdobramento, incorporação e receituário homeopático. Nessa última atividade trabalhou em diversos Centros Espíritas de várias cidades em que morou durante seus 54 anos de labor mediúnico.

Como médium psicofônica, pôde entrar em contato com obsessores, obsidiados e suicidas, aos quais devotava um carinho especial, sendo que muitos deles tornaram-se espíritos amigos dela. Era costume dela, ler nos periódicos e jornais, nomes de suicidas e orava por eles constantemente, catalogando-os num livro de preces criado por ela. Era o que fazia como forma de reparação ao seu suicídio pretérito por afogamento. Passado algum tempo, muitos deles vinham agradecer-lhe as orações e davam-lhe fortes abraços e passeavam com ela de braços dados pelo casarão em que morava, sem que ela, confusa, soubesse distinguir se o visitante era encarnado ou desencarnado...

Pelo desdobramento noturno Yvonne Pereira visitava o mundo espiritual, amparada por seus orientadores, coletando as crônicas, contos e romances com os quais hoje nos deleitamos. Ela deixou 20 obras de sua lavra mediúnica, entre as quais “Memórias de Um Suicida”, considerado por Chico Xavier a que melhor retrata a profundeza do Umbral. Esse livro, ditado pelo Espírito de Camilo Castelo Branco,
foi recebido em 1926, mas somente editado 30 anos depois, em 1956, pela FEB. São também de sua lavra os seguintes livros: “Nas Telas do Infinito”, “Amor e Ódio”, “Nas Voragens do Pecado”, “O Drama da Bretanha”, “Cavaleiro de Numiers”, “Ressurreição e Vida”, “Sublimação”, “Dramas da Obsessão”, “Devassando o Invisível” e “Recordações da Mediunidade”, tendo como autores espirituais, os Espíritos de Bezerra de Menezes, Charles, Leon Tolstoi e Roberto de Canalejas.

Embora conhecesse bem a arte poética, jamais psicografou qualquer poema. Ela deixou ainda uma série de 10 livros destinados ao público infanto-juvenil, recebidos por intuição e supervisionados por Bezerra de Menezes e Leon Denis, livros que ainda não foram publicados. Yvonne disse, em entrevista a Jorge Rizzini, em 1972: “A formação do meu caráter, foi feita pelo Dr. Bezerra; sempre segui os seus conselhos. Mas houve outros Espíritos que me guiaram como Bittencourt Sampaio e Eurípedes Barsanulfo, com quem trabalhei muito, principalmente em curas de paralíticos”. A maior parte de sua atividade mediúnica foi exercida na cidade de Lavras e outras cidades de Minas Gerais.

Ela foi esperantista convicta e trabalhou arduamente na sua propaganda e difusão, através de correspondência que mantinha com outros esperantistas, tanto do Brasil quanto do exterior. Yvonne Pereira serviu como médium, de 1926 a 1980, quando um acidente vascular cerebral impossibilitou-a para a atividade mediúnica. Sempre humilde e vivaz, mudou-se depois para o Rio de Janeiro indo morar num casarão em Piedade, num subúrbio do Rio, em companhia de sua irmã casada, Amália Pereira Lourenço, também espírita.

Na noite de 9 de março de 1984, vitimada por trombose, desencarnou durante uma cirurgia a que se submeteu no Hospital da Lagoa, no Rio de Janeiro. Seu corpo foi sepultado no Cemitério de Inhaúma. Contava ela com 83 anos de existência e mantivera-se solteira, cumprindo dignamente o mandato mediúnico exercido com amor e total devotamento aos seus semelhantes. . .




Bibliografia:
Danilo Vilela – Jorge Rizzini
Revista “Reformador” 01/1982
Jornal “Macaé Espírita” jan/fev-2000
Jornal “O Espírita Mineiro” 7/8-2008

Jc.
S.Luis, 20/5/2011.

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